domingo, 5 de maio de 2013

O Urbanismo e o Clima



As mudanças climáticas têm consequências diferenciadas em nosso planeta. Produz secas e diversos problemas, em sua maior parte, afetando a produção de alimentos e outras graves consequências que atingem os países mais pobres e as camadas mais pobres. 

É importante compreender que todas as questões relacionadas com a ocupação do solo urbano, também se inter-relacionam com fatores climáticos em grande escala, numa perspectiva dinâmica aplicada ao ordenamento urbano. 
Algumas questões devem ser consideradas para elaboração de projetos urbanísticos e arquitetônicos, visando atender questões de sustentabilidade, e principalmente, buscando o retrocesso dos efeitos climáticos da melhor forma possível. A análise da densidade de ocupação urbana do solo, a morfologia urbana, o estudo do topo clima, o balanço energético da atmosfera urbana, o campo térmico urbano e a “ilha de calor”, a topografia, o vento e a circulação de ar, a influência urbana no bioclima humano, o conforto bioclimático, a qualidade do ar, cartografia topo climática, a vegetação e a água, contrastes termo higrométricos espaciais, entre outras questões. 

É fato que o planeta está se aquecendo por causa do acúmulo de gases poluentes na atmosfera, como o gás carbônico e o metano, derivados da atividade humana e que propostas de drenagem e arborização, são importantes, mas não respondem a outras dimensões da problemática. Seriam necessárias medidas mais complexas, pois ainda existiriam as grandes interferências do concreto e do asfalto existente nas cidades e a utilização destes materiais, em substituição ao meio natural, provoca inevitavelmente o aumento da temperatura das cidades. Este fenômeno, denominado “ilha de calor”, representa anomalia térmica que torna as metrópoles mais quentes que as regiões vizinhas, sejam áreas não antropizadas ou áreas rurais. 

Qualquer que seja a cidade, não importa em que país, é local onde o homem transformou o ambiente natural. Esta transformação é negativamente impactante em função da inevitável eliminação de cobertura vegetal. 

Nos países menos desenvolvidos, a produção de lixo e a pouca estrutura relacionada a equipamentos de saneamento básico resultam em poluição de corpos d´água pela emissão de dejetos e abertura aleatória de poços de água, em prejuízo aos cursos subterrâneos, além do consumo de água inadequada à saúde. 

Nestes mesmos países, por dificuldade em solucionar a questão do transporte público, a cada dia mais veículos individuais circulam pelas vias, demandando o alargamento das existentes e a abertura de novas, além de mais e mais estacionamentos públicos. 

As consequências das implantações de cidades são profundas, sobretudo sobre o meio ambiente natural. Mas permanece a tendência em permitir o adensamento dos núcleos urbanos em proporções intensas. 

A questão que se coloca é a necessidade de solucionar o grave problema da intensificação do clima urbano, além dos outros problemas decorrentes das grandes aglomerações, separando a abstração da realidade sufocante. 

No Distrito federal existe um decreto, de número 14783, publicado em 1993, que tombou como patrimônio ecológico várias espécies arbóreo-arbustivas. Este instrumento legal estabelece, além do tombamento destas espécies previamente definidas, que o corte, a erradicação, o transplante e a poda de espécies de qualquer natureza, em zona urbana ou de extensão urbana, em área pública ou mesmo privada, requerem a autorização da Administração Regional competente, ouvida a NOVACAP, órgão responsável pela manutenção dos espaços verdes do Distrito Federal. 

Consta também, deste decreto, que a erradicação de árvores é estritamente vinculada ao seu estado fitossanitário, possibilidade iminente de queda, interferência com redes aéreas ou subterrâneas, ocorrência comprovada de malefícios causados à saúde e riscos às edificações. 

Além disso, exige que as normas urbanísticas de qualquer área, referentes à aprovação de parcelamentos urbanos, constem de exigências sobre a manutenção de espécies de porte superior a 2,50m ou com circunferência superior a 20m. 

Ao lado destas exigências, muitas normas urbanísticas requerem área de permeabilidade interna aos lotes. Contudo, a materialização destas áreas não é claramente especificada por estas legislações. Logo, soluções alternativas são sempre buscadas pelos proprietários, como forma de escapar do ajardinamento e do plantio de árvores. Em alguns casos, a Carta de Habite-se tem sua emissão bloqueada pela vistoria fiscalizadora do imóvel, quando verificada a impermeabilização destas áreas incluídas no projeto arquitetônico aprovado ou visado. Evidentemente, sob o protesto do proprietário. 

Lamentavelmente, as áreas de permeabilidade previstas em legislação têm objetivo muito mais associado ao escoamento de águas pluviais – fator, igualmente, de extrema importância – do que à meta tão necessária de atenuar o desconforto ambiental causado pelas construções urbanas. 

Neste sentido, muitas normas permitem que a área de permeabilidade seja substituída por sistema de captação e armazenamento de águas pluviais, para posterior utilização específica na edificação, afastada a possibilidade de consumo humano e outras condições que exijam que a água seja potável. 

Ao mesmo tempo, os planos diretores excluíram as áreas de permeabilidade de quase todos os lotes residenciais unifamiliares, na medida em que ampliou a área total das unidades imobiliárias onde a permeabilidade deve ser exigida. Em consequência, os lotes de uso residencial unifamiliar, por suas dimensões sempre inferiores aos lotes destinados a outros usos, se ausentaram desta obrigação, mesmo sendo maioria em qualquer núcleo urbano. 

Por sua vez, os projetos arquitetônicos de uso residencial unifamiliar refletem a intenção de utilizar a totalidade do lote. Seja qual for a motivação, ocupar todo o espaço disponível é ocorrência comum. Nestes projetos, sequer um pequeno jardim é proposto. 

O resultado tem sido a contínua impermeabilização do solo em vasta área urbana, com a supressão, inclusive, de elementos vegetais pré-existentes, que sequer constam do projeto arquitetônico como forma de driblar o que chamam de “burocracia para arrancar uma árvore”. 

Muito comuns são as ocorrências em que moradores exigem do Poder Público a retirada de árvores em área pública, que lhes são vizinhas, sob argumentos variados, entre eles a existência de animais silvestres que lhes causam incômodo. Mas o espaço urbano usurpou o meio ambiente natural e, é claro, os animais podem permanecer. Nós ocupamos a área deles, e não o contrário. Se vissem os tamanduás, onças e cobras que circulavam pelo Plano Piloto em 1960! 

O gráfico abaixo, feito pelo projeto Berkeley Earth Surface, mostra a evolução das temperaturas médias na cidade de São Paulo desde 1850. 

A linha preta é a média anual. Observando o sobe e desce dela, dá para ver como um ano pode ser diferente do outro. A linha preta permite enxergar melhor a tendência de longo prazo. Ela mostra a média de temperatura dos dez últimos anos em cada período. Ela corta os anos fora do padrão e exibe com clareza a tendência de aquecimento na cidade.

A média de temperatura, que oscilava abaixo dos 19 graus, agora fica na faixa dos 20 graus. Não é pouca coisa. Basta lembrar que apenas 5 graus em média nos separam das temperaturas de hoje e o auge da última era glacial, há 50 mil anos. 

O aquecimento de São Paulo é em parte atribuído à própria urbanização. Na medida em que a densa Mata Atlântica foi substituída por cimento, asfalto e aço, o clima local foi ficando mais próximo de um deserto. 

Cabe ao Poder Público investir numa legislação mais pertinente as questões do meio ambiente e uma forma mais eficaz de fiscalização, mas principalmente, são necessários arquitetos e urbanistas mais conscientes e com disposição para enfrentar o mercado imobiliário em prol da qualidade de vida. 

Fontes: 
Texto original por Aldo Arantes, Diretor Presidente do Instituto de Pesquisas e Defesa do Meio Ambiente (INMA)  em http://www.inma.org.br

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